Top do circuito brasileiro de SUP Race, Antonio Bonfa, o Totó, escreve sobre a remada casca-grossa feita na companhia do amigo e parceiro Daniel dos Santos, no litoral norte de São Paulo.
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“Selvageria!” Foi esse o comentário de um amigo, por sms, quando soube que havíamos acabado de conquistar “A Ilha”. E a remada foi intensa mesmo.
Sem nenhum alarde ou divulgação, partimos as 10h30 de uma ensolarada manhã de um sábado de inverno, eu e meu amigo-parceiro-de-remadas, o sábio acumpunturista Daniel dos Santos, rumo ao que chamamos de “conquista da Ilhabela”. Nosso objetivo seria fazer a uma remada da praia de Maresias à Ilhabela, no litoral norte de SP.
A adrenalina batia forte e uns dias antes ainda tentei evitar, amenizando, propondo uma sútil mudança de rota, sugerindo chegar à Ilha e se juntar com a equipe local para um treino coletivo, voltando depois de carro pro continente: “bobagem, a vibe está justamente em bater na ilha e voltar’’, quem seria eu para recuar mediante uma resposta tão segura quanto contundente.
A rota Maresias-Ilhabela já não é nenhuma novidade, foi explorada por remadores de SUP e canoa havaiana. Lembro-me lembro de relatos do Amendoim e do Alemão de Maresias, entre outros, que aportaram na ilha movidos pela propulsão dos remos. O diferencial, no nosso caso, seria realizar o bate-volta, afinal, tudo correndo bem, seriam no mínimo 30km e mais da metade em trechos de mar aberto, muito longe da costa e sujeito a fortes ventos e correntes. Não me lembro de ninguém ter feito isso antes.
O primeiro trecho, de Paúba até a ilha de Toque-Toque foi bem tranqüilo. Uns 7km com média de 8,5km/h sem fazer muita força, serviu pra nos deixar animados, porém, sabíamos que era apenas e o aquecimento, pois o ponto crítico é travessia do canal.
Traçando uma linha da ponta da ilha de Toque-Toque pra Ilhabela, no ponto mais próximo, são no mínimo 8.5km atravessando na parte mais exposta e aberta do canal, pra quem conhece, fica bem próximo dos cargueiros ancorados.
Ali, no meio do canal, com grande profundidade, aproximadamente 12km do continente, e uns 06 a 08 knots de vento leste (vento que sopra do canal pra fora) tornaram as condições bem exigentes. E a nossa remada foi dura.
Antes da chegada à ilha uma surpresa: num momento senti um toque na prancha vindo de trás semelhantes aos botes de prancha, que às vezes recebemos nas provas, de competidores remando na esteira. Naturalmente achei que era a prancha do Daniel conectada em alguma onda, só que não! Quando olhei pra trás meu parceiro remava há uns três metros de distância, ou algum golfinho queria entrar na brincadeira ou um peixe grande faminto foi dar uma fuçada....
já bem perto de chegar na ilha mais uma surpresa! Não havia pontos de desembarque, apenas alguns píers, que em função da maré baixa pareciam altos pra gente. Foi quando avistei um trecho que parecia ser uma pequena praia deserta no meio de algumas pedras, e algumas pessoas reunidas em cima das pedras pareciam nos olhar.
Quando chegamos lá, a cor d’água lembrava o Taiti e tivemos a sorte de aportar numa praia particular sendo recebidos por uma família muito simpática. A dona da casa, surpresa com a visita inesperada, perguntou de onde viemos, quando respondemos dizendo que viemos de Paúba e iríamos voltar remando ela ficou incrédula. Muito atenciosa nos ofereceu água e banana. Ficamos 15 minutos na Ilha e nos preparamos para a volta, o vento parecia ter dado trégua e ali estava começando o nosso maior desafio.
Parte II - A volta
Insistimos uns dois a três quilômetros na remada em direção a ilha de Toque-Toque e vimos que não daria futuro. O vento tinha virado pra sul, entrava com uns 8-9 knots de través, corrente contrária, muita ondulação desencontrada e remada unilateral fizeram nossa média diminuir bastante comprometendo a própria segurança náutica, pois estávamos no meio do canal, já com18km remados e começando a sentir cansaço, principalmente eu pois estava com uma prancha de velocidade projetada para águas lisas, bem estreita, com 24’’ de largura.
Foi quando sugeri ao Daniel a mudança na de rota, direto pro continente pegando o vento sul na popa. Deu resultado. Rapidamente subimos a média e diminuímos esforço, o problema é que estávamos uns 12km do continente e numa área bem longe do movimento dos barcos, que nesse trecho andam mais costeiros. Nos sentindo um palito de dente no meio do oceano, nessa hora só com muita fé na remada e no parceiro ao lado pra se manter focado no objetivo. Na medida que descíamos íamos dando bordo pra conseguir avançar um pouco e nessa batida fomos por uma hora e meia ou mais.
Quando nos aproximamos, mais uma surpresa: o trecho costeiro, apesar de um pouco mais seguro para um eventual resgate, era muito difícil de andar pois o backwash era intenso e as cãimbras davam sinal, mesmo assim resistimos e quando atravessamos a ponta de Toque Toque foi uma imensa alegria ver as baias que compõe uma das paisagens mais bonitas do mundo nos recebendo com um mar liso de fazer inveja!
Mais uns 04 a 6km ainda nos aguardavam, mas fomos relaxando e curtindo o visual. Chegando na ponta de Paúba me despedi do Daniel e toquei direto pro Canto do Moreira, em Maresias. Daniel remou 31km até Paúba e eu fiz 34 km até meu destino. Chegando lá fui recebido pela esposa e os amigos com uma sensação indescritível de felicidade que só uma remada dessas pode proporcionar.
Um dos objetivos do projeto foi treinar e me aperfeiçoar na nova prancha Sprint projetada com 24.5’’ de largura para ser a mais rápida em águas lisas, mas também comprovadamente estável em condições de mar, do meu novo patrocinador Starboard, que em conjunto com a loja Boardhouse e o apoio de equipamentos da G-Zero estão viabilizando meu retorno ao circuito brasileiro de SUP com equipamentos de ponta e novos projetos no radar. Aguardem novidades!
Big Aloha.
Totó